terça-feira, 23 de abril de 2013

i am free

Tudo parecia novo para ela. O vento, sussurrando entre as árvores, suavemente balançando as folhas. O céu, de um azul-claro estonteante, com nuvens fofas como algodão, parecendo pinceladas. O murmúrio de um rio correndo em algum lugar perto, mas escondido, a água batendo contra pedras. O próprio cheiro, de terra quente, de grama e de árvores, cheiro do próprio corpo, nada parecia real. 
Suas roupas eram farrapos. Não que sentisse vontade de usá-las, era um costume antigo. Não se lembrava porque, mas precisava usá-las. O dia estava muito quente. Tirou as roupas e as atirou longe. Começou a andar, seguindo o som da água. Não temia mais os animais que existiam naquela floresta. Fazia muito tempo que tinha aprendido como fugir deles, ou, se necessário, atacá-los. 
A água lhe parecia ainda mais cristalina. Um lugar em que seus iguais não haviam chegado. Seguiu o curso do rio, andando pela água, até chegar a um lago fundo. Mergulhou sem hesitar, a água tão fria que quase doía. Nadou algum tempo, observando os pequenos peixes que a acompanhavam. Quando resolveu sair, deitou-se ao sol para se secar. Então pegou um punhado de lama e passou no rosto e no corpo. A terra iria protegê-la do sol e dos mosquitos. 
Saiu para catar frutas, diversas frutas que cresciam por tudo ali. Juntaria isso com raízes que encontrasse pelo caminho e alguns restos da carne do dia anterior. Não sentia a necessidade de caçar todo dia. A carne raramente entrava no seu cardápio, mas ontem fora um dia especial. Fazia dez anos desde... algo. Acordara com a memória meio ruim, mas não estava se importando. A memória não era realmente necessária ali.
Fizera um esconderijo suspenso para dormir e guardar seus restos de comida. Foi para lá, escalando árvores como havia aprendido fazia tempos. Tinha mãos e pés calejados pelos anos de prática. Havia caído incontáveis vezes no processo. Algumas vezes chegou a pensar que iria morrer, mas não estava sozinha na época... 
Havia poucas coisas no seu esconderijo. Algumas mochilas, restos de comida, roupas rasgadas. Ela gostaria de poder costurar roupas para si, mas não tinha essa capacidade. Porém, sempre aproveitava o couro e a pele quando caçava. Estava tudo acumulado em um canto, algumas partes costuradas juntas para fazer cobertas. 
Um barulho alto chamou a sua atenção. Levantou a cabeça, escutando. Um barulho que não ouvia fazia tanto tempo que não reconheceu a princípio. Se jogou para fora do esconderijo, descendo a árvore tão rapidamente que quase caiu. Correu pela floresta, alguns galhos se enganchando nos seus cabelos extremamente longos e emaranhados. Tropeçou várias vezes ao longo do caminho, até que se viu livre, em um campo plano. 
Havia um grupo de homens parados na frente de um helicóptero. Assim que a viram, deram um passo para trás. Nunca teriam imaginado isso. Uma mulher nua, coberta de lama e olhos selvagens, os olhando com tanta raiva que queimava. Parecia saída de algum livro, uma protetora das florestas. Então ela gritou para eles, tão alto que fez pássaros saírem voando da copa das árvores, e voltou correndo para dentro da vegetação.

28/12/12

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